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quarta-feira, 6 de abril de 2011

Egito não viveu uma revolução - pelo menos, não ainda

Críticos dizem que mudanças ocorridas no país não são suficientes para justificar uso do termo. Ou pior: talvez Egito já viva uma contrarrevolução


Desde o dia 11 de fevereiro, quando Hosni Mubarak renunciou à presidência após 30 anos de governo, fala-se do Egito como um exemplo de luta pacífica pela democracia, caso de revolução pelas mãos do povo. O que não se percebeu, ainda, é que o Egito não viveu uma verdadeira revolução. Não ainda. “Assistimos a uma estranha empolgação, como se uma irresistível onda de revoluções democráticas estivesse lavando o Oriente Médio. As pessoas parecem não notar que nenhum regime caiu, de fato, ainda", disse ao site de VEJA George Friedman, presidente da consultoria de política internacional Stratfor. "No Egito, por exemplo, Mubarak renunciou e, em seu lugar, entraram generais que suspenderam a Constituição e o Parlamento", diz ele. "É isso que vamos chamar de grande vitória do povo?"

Sim, o povo foi à Praça Tahir, protestou pacificamente e derrubou o ditador. A narrativa, contudo, não é nem de perto tão simples. “Para começar, a coisa mais interessante não era que havia 300 000 pessoas na Praça Tahir, mas que havia somente 300 000. O que estava fazendo o resto?”, questiona Friedman. “Mubarak tinha mais apoio na sociedade do que se pensava e esses apoiadores permanecem lá." Por trás da limitada resistência que encontraram os manifestantes - principalmente se comparados aos rebeldes da Líbia -, diz Friedman, estava o próprio Exército. A instituição, desde o princípio, decidiu não se opor à queda de Mubarak. “O Exército queria que Mubarak caísse porque não desejava ver seu filho no cargo, como o ditador planejava. Os militares conseguiram exatamente o que sonhavam”, acrescenta o analista.

No poder, o Conselho Militar passou a exercer o papel antes ocupado pelo ditador. Há relatos de prisões de ativistas, desaparecimentos e até torturas. As mulheres foram excluídas da elaboração das emendas à Constituição. E, para coroar esse processo, o gabinete egípcio aprovou recentemente uma lei que criminaliza os mesmo protestos que, teoricamente, entregaram ao país sua chance de democracia. Se a medida for sancionada pelo Conselho Supremo das Forças Armadas, aqueles que fizerem greves ou manifestações que, de alguma maneira, interfiram no funcionamento dos negócios do país, pagarão com até um ano de prisão ou com uma multa de valor estratosférico, equivalente a 1,2 milhão de reais. Na última sexta-feira, dezenas de milhares foram às ruas para 'protestar contra o antiprotesto'.


Na marcha ré - No que se refere ao conceito de revolução, alguns analistas vão mais longe do que Friedman, falando em retrocesso na marcha democrática do Egito. “Talvez o Egito já esteja vivendo sua contrarrevolução”, afirma Michael Walzer, professor de política internacional da Universidade Harvard e autor de Pluralism and Democracy (Pluralismo e Democracia, Éditions Esprit). Para ele, o referendo sobre a emenda constitucional realizado em 19 de março foi a principal derrota para os “revolucionários”. Na votação, 45 milhões de eleitores tiveram que optar pelo ‘sim’ ou pelo ‘não’ a um pacote de emendas à antiga Constituição que vigorava durante a era Mubarak.

O 'sim' venceu com apoio de 77% dos egípcios. A questão de maior apelo era a realização de eleições ainda em 2011 - encurtando a permanência do Exército no poder. É bastante significativo, contudo, que os jovens que organizaram as manifestações antigoverno pela internet, o ex-Nobel da Paz Mohamed ElBaradei e o secretário geral da Liga Árabe, Amr Moussa, tenham apoiado o ‘não’. Eles argumentavam que não há boas emendas a uma Constituição ruim. Além disso, esse grupos queriam tempo para se organizar em partidos. Enquanto isso, as duas forças políticas mais importantes e organizadas do Egito foram partidárias do sim: os ex-integrantes do partido de Mubarak e os fundamentalistas da Irmandade Muçulmana.

Democracia - O resultado do referendo mostrou que as forças políticas liberais no Egito são as que têm menos apoio dos eleitores. “O Exército e o antigo partido de Mubarak devem dominar as próximas eleições. E os jovens que lideraram as manifestações serão apenas uma voz minoritária quando o governo surgir”, diz Walzer. “Eles não vão assumir o poder em um futuro próximo. Para chegar a isso, terão de se organizar e começar uma longa batalha política."


Fonte: Revista Veja online


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